segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Um pouco da historia do conhecimento geografico

O Mediterrâneo, um mar interior de um azul profundo e águas cristalinas semeado de ilhas, foi palco de duas civilizações, a grega e a romana, que fundamentam a cultura ocidental. Mas a ampliação do horizonte geográfico para o Oriente não se deveu nem aos gregos nem aos romanos, ocorrendo bem depois. Foi obra, sobretudo, dos árabes que, conquistando terras e homens do século VI ao XII, difundiram a religião muçulmana, desde o extremo Ocidente, na Espanha, até o Oriente, na China, tendo como centro a cidade de Bagdá.1

Esse domínio árabe tinha duas características importantes, de um lado, o conhecimento geográfico e, de outro, a peregrinação, ambas as características referenciadas na mobilidade territorial. A primeira, diz respeito ao caráter de uma civilização com presença de povos nômades que, necessariamente, precisam desenvolver o sentido de orientação e o conhecimento dos lugares. A segunda característica se relaciona à religião muçulmana, que sugere que todo muçulmano deve proceder, pelo menos uma vez na vida, a peregrinação à cidade sagrada de Meca.

Orar, voltando-se sempre para Meca, exigia orientação constante. Estendendo o tapete sob o solo, os muçulmanos sacralizavam o lugar e se orientavam para entrar em comunhão com Alá. Orientados pela Lua e estrelas, percorriam distâncias; conhecer o céu não se constituía numa simples curiosidade, mas era uma necessidade. Era preciso, primeiro, observar o céu para se orientar pelos desertos. Assim, antes de qualquer cartografia dos terrenos, foi a celeste que primeiro se desenvolveu. Instrumentos foram concebidos ou assimilados de outras civilizações para permitir melhor orientação.2

O domínio intelectual dos árabes estava nas mãos dos sírios e bizantinos, que traduziram muitas obras do grego para o árabe.3 Foi entre os anos de 800 a 1050 que o conhecimento dos árabes alcançou maior apogeu. A importância desse conhecimento para o desenvolvimento da expansão árabe era clara para os califas, tanto que o califa Al-Mamun acabou por fundar, em Bagdá, uma biblioteca, um observatório e uma academia científica. Foi por sua ordem que a obra de Ptolomeu foi traduzida, transformando-se na principal referência intelectual dos árabes, junto das obras de Aristóteles. O sentido de observação permanente da abóboda celeste permitiu aos árabes elaborar correções aos conhecimentos herdados dos gregos e obter maior precisão nas medidas dos meridianos. Preservaram, contudo, a idéia de imobilidade da Terra.

Quanto ao conhecimento das terras, tanto as viagens comerciais e de peregrinos, como as invasões expansionistas dos árabes concorreram para o conhecimento dos lugares. Acima de tudo, esse conhecimento era fundamental para os árabes na preservação da unidade do seu Império; tanto quanto tinha sido para os romanos. Inventários foram elaborados, descrevendo os recursos naturais, os povos e os costumes. As rotas comerciais, assinaladas. Guias para os viajantes foram concebidos com indicação dos lugares sagrados a serem visitados nas peregrinações, fosse de que recôndito se originasse o peregrino. Além do conhecimento dos céus, o dos lugares se desenvolveu intensamente durante o período de apogeu dessa civilização. Produziu-se um conhecimento geográfico, acima de tudo, descritivo.

Como dissemos, os árabes conheciam mais o Oriente do que o Ocidente. Talvez aí resida, em parte, a explicação de terem incorporado tantas especulações fantásticas nos relatos de viagens e nas descrições dos lugares. É conhecido que, no Oriente, em particular na Índia, os limites entre o real e o irreal possuíam uma fronteira mais tênue do que no Ocidente.

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